quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Bandeira


Comecei a escrever quando era muito jovem e triste e arrogante como são os jovens. Lí um poema de Manuel Bandeira e disse para mim mesmo que aquilo eu também poderia escrever.

O poema dizia

“Quando hoje acordei, ainda fazia escuro
(embora a manhã já estivesse avançada).
Chovia.
Chovia uma triste chuva de resignação
como contraste e consolo ao calor tempestuoso da noite.
Então me levantei,
bebi o café que eu mesmo preparei,
depois me deitei novamente, acendi um cigarro e fiquei pensando...
- Humildemente pensando na vida e nas mulheres que amei.”

Desde aquele dia já escrevi muitos poemas, mas nunca consegui escrever um só que chegasse ao menos perto desse poema que Bandeira dedicou a Jaime Ovalle.

2 comentários:

Helô Lima disse...

O poeta me ganhou quando li, pela primeira vez, "Última Canção do Beco". Sempre me emociono ao reler.

Beco que cantei num dístico
Cheio de elipses mentais,
Beco das minhas tristezas,
Das minhas perplexidades
(Mas também dos meus amores,
Dos meus beijos, dos meus sonhos),
Adeus para nunca mais!

Vão demolir esta casa.
Mas meu quarto vai ficar,
Não como forma imperfeita
Neste mundo de aparências:
Vai ficar na eternidade,
Com seus livros, com seus quadros,
Intacto, suspenso no ar!

Beco de sarças de fogo,
De paixões sem amanhãs,
Quanta luz mediterrânea
No esplendor da adolescência
Não recolheu nestas pedras
O orvalho das madrugadas,
A pureza das manhãs!

Beco das minhas tristezas.
Não me envergonhei de ti!
Foste rua de mulheres?
Todas são filhas de Deus!
Dantes foram carmelitas...
E eras só de pobres quando,
Pobre, vim morar aqui.

Lapa - Lapa do Desterro -,
Lapa que tanto pecais!
(Mas quando bate seis horas,
Na primeira voz dos sinos,
Como na voz que anunciava
A conceição de Maria,
Que graças angelicais!)

Nossa Senhora do Carmo,
De lá de cima do altar,
Pede esmolas para os pobres,
Para mulheres tão tristes,
Para mulheres tão negras,
Que vêm nas portas do templo
De noite se agasalhar.
Beco que nasceste à sombra
De paredes conventuais,
És como a vida, que é santa
Pesar de todas as quedas.
Por isso te amei constante
E canto para dizer-te
Adeus para nunca mais!

Celso Japiassu disse...

A aparente simplicidade da poesia de Bandeira, Helô, esconde o trabalho cuidadoso do texto, da escolha da palavra exata.Mestre maior.