sábado, 18 de novembro de 2017

Cavalaria


Estropiados depois de um dia de marcha a cavalo, nádegas feridas, costumávamos dizer entre nós “imagina se um dia vamos lembrar disso e dizermos bons tempos aqueles”. Nosso corpo tinha o cheiro do suor das montarias, um cheiro tão forte que penetrava nas unhas e demorava meses para sumir.

Os oficiais faziam questão de parecerem o que eram na verdade: oficiais de cavalaria. E se comportavam na velha tradição da mais antiga das armas dos exércitos. Eram duros, grossos, cuspiam palavrões, exigiam que fizéssemos as proezas que eles faziam nos obstáculos dos exercícios exteriores. Com a diferença de que eles montavam cavalos árabes ou ingleses e nós os pangarés mal treinados da cavalhada militar.

Os exercícios em picadeiro serviam para divertir os alunos das outras armas. Eles tapavam o nariz quando passávamos, por causa do nosso cheiro. Noventa por cento da nossa turma levavam quedas espetaculares no movimento de terra-cavalo, que consistia em passar a perna direita por cima da sela, com o cavalo a galope, saltar no chão e no mesmo impulso tornar a montar. Só não caia quem não tinha coragem de saltar. E o quartel inteiro gargalhava. À noite, não nos deitávamos. Caíamos na cama, num sono tão profundo que era impossível sonhar.

Bons tempos aqueles.



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