quinta-feira, 16 de setembro de 2021

Aquela que não foi vencida

Viajou nos porões lotados dos navios negreiros vindos da África entre corpos feridos e castigados. Escondeu-se nos cantos, entre as frestas, conduzida por quem havia perdido tudo. Ponto de fuga, sonho, refúgio da resistência que não poderia morrer porque a vida tinha que prevalecer, afirmar o que possui de absoluto. Escapou das perseguições, das buscas e da repressão dos capitães-do-mato. Viajou de mão em mão, conquistou meninos burgueses e afirmou-se entre os ladrões. Virou mercadoria, fugiu dos policiais e resistiu nas prisõesnas masmorras em que toda dignidade é vencida e escorre pelos esgotos junto com fezes e sangue. 



Foi saudada em passeatas, discutida nos parlamentos, transformou-se na química de medicamentos para aliviar a dor dos desenganados. Foi às vezes tolerada e continuou perseguida. Continuou a exibir a natureza do que não pode ser vencido porque vem compensar a triste natureza humana que precisa das promessas do sonho para continuar a ter vida. 

 

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