Portinari
Deponho aqui com palavras
o pensamento assim cristalizado
entre colunas de ódio, de amor
e sentimentos tortos de abandono.
o pensamento assim cristalizado
entre colunas de ódio, de amor
e sentimentos tortos de abandono.
Sobre
ilhas, sobre a multidão
de retirantes que há cem anos
passam em frente a esta casa
e trazem marcas do sertão.
de retirantes que há cem anos
passam em frente a esta casa
e trazem marcas do sertão.
O
sertão da Paraíba: fuga
e cansaço entre os arbustos,
areia fina, cactos sangrentos
e sede e fome nauseada.
e cansaço entre os arbustos,
areia fina, cactos sangrentos
e sede e fome nauseada.
A
cara amarelada dos defuntos,
o deformado corpo das crianças,
o riso desdentado dos doentes,
o opaco olhar de cegos e aleijados.
o deformado corpo das crianças,
o riso desdentado dos doentes,
o opaco olhar de cegos e aleijados.
A
vida insistindo longe dos tapetes,
da decorada sala de escritório,
da mesa posta para a ceia
de tâmaras e nozes e maçã assada.
da decorada sala de escritório,
da mesa posta para a ceia
de tâmaras e nozes e maçã assada.
São
estes rostos sem boca, olho
e nem toque remoto de esperança
a dizer que as tardes são manhãs
de noites penetradas de agonia.
e nem toque remoto de esperança
a dizer que as tardes são manhãs
de noites penetradas de agonia.
São
ecos impotentes entre o som
das caixas eletrônicas, do ritmo
batido dos surdos, das guitarras
e da voz dos amplificadores.
das caixas eletrônicas, do ritmo
batido dos surdos, das guitarras
e da voz dos amplificadores.
A
encardida, grossa pele
das prostitutas de catorze anos
no trotoir das ruas do Recife,
as suas pernas cobertas de feridas.
das prostitutas de catorze anos
no trotoir das ruas do Recife,
as suas pernas cobertas de feridas.
Está
aqui, no ar das avenidas,
o que restou da dor destas meninas:
o seu sorriso de gengivas podres
pelas calçadas do Capibaribe.
o que restou da dor destas meninas:
o seu sorriso de gengivas podres
pelas calçadas do Capibaribe.
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